Peixe..Jaraqui Corre Risco de Extinção
Peixe: Jaraqui Corre Risco de Extinção. Manaus, sábado, manhã com cara de chuva, 6 de janeiro e de Reis. O Projeto Jaraqui deixou o resguardo, merecido por mais um desesperado esforço pela redemocratização do país, evento tantas vezes repetido que já integra o calendário cívico nacional – a cada geração de brasileiras e brasileiros, uma redemocratização, com picanha, cerveja e um ah! que refrescante sensação de bem-estar.
Uma ousadia: bem no Centro Histórico da cidade mais bolsonarista do Brasil, uma confraternização de sobreviventes de duas frentes de resistência humanitária: 1- a insistência dos que não morreram fisicamente e ainda perambulam, voluntários da utopia, e 2- a presença dos que foram consumidos na câmara de tortura em que se transformou a cidade, com seu principal instrumento de extermínio das vontades e dos quereres: a indiferença, que sufoca talentos, castra inteligências e coopta a cidadania para o suicídio ético.
Viver é um vício ancestral. Esta é a principal resistência que afronta e mantém desatinados os exterminadores do passado, presente e futuro, inseguros em suas zonas de conforto: “Como é possível que esses desgarrados filhos de Eva (ou de Lillith) suportem tanto da nossa ira?” Certas coisas estão fora do nosso controle; essa necessidade de viver, por exemplo.
O Projeto Jaraqui tropeça, é calado no sufoco da indiferença… mas sobrevive. Andando de lado e olhando pro chão, murmura: “Ela se move, e não é plana”. Quem pode mais do que isso?
No extremo da rua (ou vice-versa) o Jaraqui, desta vez a proteína do rio, o peixe com maior concentração de Ômega 3, sem o qual não haveria civilização ribeirinha – diz-se até que esse peixe é de tamanha fartura que dá até em árvore.
Pois bem: o jaraqui do rio, como o da rua, está ameaçado de extinção pela culturas da indiferença, que é endêmica de Manaus, cuja intelligentsia descompensada detesta o passado, o presente e o futuro e se resguarda em uma bolha antisséptica, para não se contaminar com a realidade. Não são suficientes espécimes como o tambaqui, o pirarucu protegidos pelo defeso, como sobreviventes do desperdício criminoso praticado todos os dias nos rios onde são capturados e nas feiras da cidade.
Toneladas de peixe são jogadas fora; serviriam para produzir ração, farelo, farinha (piracuí) etc. para compor os planos de economia sustentável que enchem a fala dos amazonólogos formados em linhas de montagem e incapazes de pôr as mãos na obra.
O defeso surgiu quando armadores e pescadores profissionais começara a sentir no peso de suas redes que “esse rios enormes que jamais deixariam de dar peixes”, começavam, sim, a escassear, obrigando-os a ir cada vez mais longe (e cada vez mais caro) para abastecer o mercado. A Universidade Federal do Amazonas e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia já aconselham, com dados científicos e não com “achismos” o estabelecimento de uma política de defeso para o Jaraqui.
Peixe..Jaraqui Corre Risco de Extinção. Ora, se está faltando água em nosso rios, por que não faltarão peixes? O jaraqui do rio e o jaraqui da rua estão ameaçados de extinção. Não é uma coincidência. É uma política de apagamento.
Dos bichos, das águas, das floresta e das gentes. Está chegando a Era do Minério e seu exército de transformers, para apagar também a terra. Não é alarmismo. Não é fatalismo. Não é teoria da conspiração. Já vivemos isso, bem aqui, em nossas ilhargas (e estamos vivendo). Tipo da aposta que ninguém vai ganhar. Quem viver verá. Salvem o jaraqui.
Por Aldísio Filgueiras é poeta, jornalista e membro da Academia Amazonense de Letras
Fonte RealTime1
Foto Divulgação